Estratégias para adequação à Legislação Trabalhista e prevenção da caracterização de trabalho escravo
A conformidade com a legislação trabalhista é essencial para as organizações que visam assegurar um ambiente laboral justo e digno, reduzir passivos e autuações fiscais.
O levantamento realizado pelo Sistema de Inspeção ao Trabalho, revelou que no ano de 2023 a relação de pessoas físicas e jurídicas na lista de condenação a trabalho escravo somou em 473 nomes. Estes nomes somente são adicionados ao cadastro após trânsito em julgado do processo administrativo, ou seja, presume-se que este número seja na pratica ainda maior.
Prevenção
Diante do cenário atual a prevenção da caracterização de trabalho escravo, torna-se uma prioridade inquestionável. Por isso, nesse artigo, iremos fornecer orientações estratégicas para as empresas do agronegócio se adequarem à legislação e mitigarem os riscos associados ao trabalho análogo à escravo.
A princípio é importante entender o que caracteriza como trabalho análogo a escravo.
Segundo o artigo 149 do Código Penal Brasileiro:
“o trabalho análogo à escravidão é caracterizado pela submissão de alguém a trabalhos forçados ou a jornadas exaustivas, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o Empregador ou seu preposto”.
Penalidade
A penalidade aplicada pela caracterização do trabalho escravo constitui em reclusão, de dois a oito anos de prisão, além de multas e a expropriação das terras, sem direito a indenização. Além de, claro, de multas por autuação fiscal, e indenizações pelos danos causados ao trabalhador, e inclusão do nome do empregador na lista de suja de Inspeção do Trabalho, de consulta pública.
Trabalho análogo a escravo no agro
No agronegócio o trabalho está ainda mais exposto a fatores de caracterização, devido a influência de padrões culturais e sociais de desigualdades estruturais.
Nesse sentido, considerando estas peculiaridades, abordaremos algumas situações comuns que merecem atenção, com sua respectiva estratégia de adequação à legislação trabalhista e consequente prevenção de ocorrência de trabalho escravo.
Transporte
A depender da localização geográfica da propriedade, é possível a existência de elemento de cerceamento da liberdade dos trabalhadores, seja em relação ao acesso aos centros urbanos pela distância, ou precariedade das vias.
Diante dessas dificuldades, a falta de transporte fornecido pelo empregador, especialmente quando não há uma linha regular de transporte público, torna-se um elemento que contribui para restringir a liberdade de locomoção dos trabalhadores.
Portanto, como medida preventiva para evitar essa caracterização, é imperativo garantir a disponibilização de meios de transporte aos funcionários, permitindo-lhes acesso aos centros urbanos para necessidades essenciais, como saúde, lazer e alimentação.
Endividamento/sistema de barracão
Quando os empregados residem no local de trabalho, é comum que o salário seja compensado por dívidas de aquisição de mercadorias ou alimentos de subsistência. No entanto, é crucial realizar esse procedimento com cuidado, uma vez que há o risco de caracterização de cerceamento da liberdade.
Isso pode ocorrer devido ao constrangimento pessoal do trabalhador, diante de possíveis dívidas indevidas ou valores desproporcionais em relação ao preço de mercado.
Para evitar este cenário a compensação de débitos por compras de alimentos deve ser devidamente registrada, incluindo anotações em cadernos de compras, manutenção de recibos e Notas Fiscais, além de comprovantes de pagamento dos produtos adquiridos.
É essencial entregar uma cópia dessa documentação ao empregado, garantindo transparência e evitando possíveis conflitos relacionados ao endividamento ou ao sistema de barracão.
Retenção de documentos
É estritamente proibida a retenção de documentos dos trabalhadores pelo empregador ou seus representantes, configurando uma conduta coerciva para fins de retenção dos trabalhadores no local de trabalho.
A situação se agrava nos casos de empregado estrangeiro em situação migratória irregular. Deste modo, as empresas devem estritamente observar os prazos legais pertinentes ao registro de empregados, com a subsequente obrigação de restituição dos documentos aos respectivos titulares.
Áreas de vigência e alojamento
Moradias e alojamentos em condições precárias e degradantes constituem ato de ligação a dignidade da pessoa humana e caracteriza trabalho análogo à escravidão.
Nesse teor, as empresas ligadas ao ramo do agronegócio devem estar atentas em promover áreas de vivência e alojamentos com Instalações sanitárias em quantidade e qualidade adequada; água potável em condições higiênicas; alimentação sadia que garanta o valor nutricional e instalações elétricas que atendem a norma regulamentadora.
Atenção especial às moradias quando houver trabalhadores com famílias (núcleo familiar primário) na propriedade, estas devem habitar em moradias distintas dos alojamentos, sendo vedada a moradia coletiva de famílias.
Crianças e adolescentes
É expressamente proibida a contratação de crianças e adolescentes para auxiliar nas atividades do campo, mesmo que pertençam ao grupo familiar de empregados.
Essa medida visa assegurar um ambiente propício para o crescimento e aprendizado adequado, protegendo-os de condições que possam prejudicar seu desenvolvimento físico, mental e emocional.
Obrigações trabalhistas
O descumprimento das obrigações trabalhistas, tais como a falta de registro de contrato de trabalho, pagamento de salários em atraso, ampliação da jornada laboral sem a devida remuneração por horas extras, ausência de concessão de férias, e demais verbas, um atentado à dignidade do trabalhador e uma violação aos seus direitos constitucionais.
Tais situações, quando associadas a outros elementos gravosos, podem caracterizar a prática de trabalho em condição análoga à escravidão.
Resumo
Em resumo, a adoção dessas estratégias não apenas assegura a conformidade das empresas com a legislação trabalhista, mas também fortalece seu compromisso com princípios éticos, sociais e humanos.
Ao priorizar a prevenção da caracterização de trabalho escravo, as organizações do setor agropecuário não apenas se resguardam contra passivos legais e autuações fiscais, mas desempenham um papel ativo na promoção de um ambiente de trabalho que seja justo, digno e alinhado aos princípios fundamentais dos direitos humanos.
O Mirian Gontijo Advogados assessora empresas na adequação às leis através de um programa de compliance preventivo.
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